Quinta-feira, 28 mar 2024
 
Facebook

Dono da OAS perde bilhões com liquidação de títulos

Brasil - César Mata Pires acumulou uma das maiores fortunas do Brasil construindo estádios para a Copa do Mundo, plataformas de petróleo offshore e rodovias, do Haiti a Angola.Em seu auge, em 2014, o patrimônio líquido de Mata Pires chegou a US$ 7 bilhões, segundo o Bloomberg Billionaires Index. Hoje, é de menos de US$ 1 bilhão. O empreiteiro de 65 anos é o mais recente magnata brasileiro a ver sua fortuna cair em um momento em que a maior investigação de lavagem de dinheiro da história do Brasil coincide com o crescimento econômico lento e com as medidas de austeridade adotadas pela presidente Dilma Rousseff.

A fortuna de Mata Pires despencou em novembro, quando a Polícia Federal realizou buscas na sede paulistana de sua empresa, a OAS SA, e prendeu vários executivos, incluindo o chefe de sua principal divisão de construção, por uma suposta participação em um cartel que pagava funcionários da Petrobras, a empresa petroleira controlada pelo Estado, para fraudar o processo licitatório e obter contratos. Pires não foi ligado, nem acusado de qualquer irregularidade. Embora seja apenas uma entre pelo menos seis construtoras cujos executivos foram acusados na investigação de corrupção, a OAS sofreu o maior baque no mercado de bonds.

As notas emitidas pela OAS Investments GmbH para 2019 caíram 88 por cento, para 12 centavos de dólar, desde as prisões, e a empresa descumpriu pagamentos, citando dificuldade de acesso a financiamentos. Para garantir os pagamentos devidos aos detentores de bonds, no dia 19 de fevereiro um juiz julgou procedente a expropriação de uma fatia da participação da OAS na Invepar, um consórcio de infraestrutura.

Diminuição de fortunas

Um dia depois, o Ministério Público Federal acusou seis empresas, incluindo a OAS, de desviarem fundos públicos e exigiu que elas pagassem R$ 4,5 bilhões (US$ 1,6 bilhão) e fossem banidas de novos contratos com o governo. Foi a primeira vez que os procuradores da República que investigam os supostos subornos na Petrobras acusaram as empreiteiras de irregularidades. A OAS negou as acusações. A Petrobras não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.

“A negociação, nesses níveis, mostra que o mercado de bonds está pensando que não existe saída para a OAS”, disse Klaus Spielkamp, chefe de vendas de renda fixa da Bulltick LLC, em entrevista por telefone, de Miami. “Existem dificuldades em todas as construtoras, mas a OAS foi a mais atingida. A investigação atingiu esferas mais elevadas na OAS do que em outras empresas”.

O declínio de Pires segue o de Eike Batista, que chegou a ser o homem mais rico do país, e o de Janguiê Diniz, que perdeu metade de sua fortuna em um mês em meio à especulação de que Dilma cortará os programas de financiamento estudantil que tornam próspera sua empresa do setor de educação.

Novas arenas

Pires controla 90 por cento da OAS por meio da CMP Participações Ltda, uma holding com sede em Salvador, segundo um prospecto de bonds de 2013. O único outro acionista da empresa, José Adelmário Pinheiro Filho, administrava a divisão de construção da OAS antes de ser preso na operação policial de novembro. Ele negou qualquer irregularidade. A Polícia Federal também levou sob custódia pelo menos outros três funcionários da OAS.

Fundada em 1976 no nordeste do Brasil, a OAS espalhou seu império por toda a América Latina, a África e o Oriente Médio trabalhando para clientes privados e públicos. Entre seus mais de 2.000 projetos estão a icônica ponte estaiada Octávio Frias de Oliveira, em São Paulo, e mais de 4.600 quilômetros de rodovias. A companhia, uma das maiores doadoras de campanhas políticas do Brasil, foi uma das grandes beneficiárias do boom da construção que antecipou a Copa do Mundo, no ano passado, e os Jogos Olímpicos de 2016.

Nos protestos de junho de 2013, manifestantes com cartazes se voltaram contra a OAS por lucrar com novos estádios financiados por bancos estatais à custa dos contribuintes. Um dos dois projetos da OAS para a Copa do Mundo, a Arena das Dunas, estava entre as obras destacadas pelos auditores do governo como potenciais elefantes brancos que poderiam sobrecarregar os cofres públicos. A OAS diz que as lojas e espaços de escritórios ajudarão a tornar o estádio rentável.

Apoio político

Em 2010, a OAS ganhou um contrato de 15 anos para fornecer cinco navios-sonda à Petrobras, a empresa petrolífera controlada pelo Estado brasileiro. A OAS também possui contratos para trabalho em refinarias da Petrobras, incluindo a Abreu e Lima, em Pernambuco. Os investigadores dizem que os contratos da Petrobras envolvendo a OAS totalizaram US$ 51,5 bilhões entre 2005 e 2014.

Os investigadores afirmam que Pinheiro era o contato direto da OAS com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa em um esquema de cartel. Conhecido como “Léo”, o ex-CEO foi listado como contato da OAS em um arquivo usado por Costa para manter o controle sobre as empresas das quais ele solicitava apoio político, segundo documentos judiciais. Os investigadores afirmam que Pinheiro, que deixou o cargo de CEO depois que foi preso, se reuniu com outros suspeitos de formarem parte do cartel para determinar os vencedores dos contratos.

Rebaixamento dos ratings

O juiz federal Sérgio Moro disse no dia 15 de dezembro que, como executivos da OAS teriam usado um doleiro para movimentar dinheiro até 2014, ele precisaria suspender todos os contratos ou manter os executivos na prisão para interromper o “esquema criminoso”. Ele disse que a segunda opção causaria menos danos colaterais. Edward Rocha de Carvalho, advogado que representa Pinheiro e outros réus relacionados à OAS, disse em entrevista por telefone que as prisões são “absolutamente ilegítimas” e que não há nada ilegal no contato de Pinheiro com Costa.

Ele disse que o depoimento do doleiro Alberto Youssef mostra que qualquer dinheiro que tenha sido movimentado pela OAS não possuía relação com a Petrobras. A assessoria de imprensa da Petrobras não respondeu imediatamente a um pedido de comentário. A OAS disse, em resposta enviada por e-mail, que nega as acusações. A empresa afirmou em dezembro que realiza suas atividades com integridade, guiada pela conduta ética e pelo respeito às leis. Um representante de Pires preferiu não comentar a respeito de seu patrimônio líquido.

Expropriação de participação

Segundo a Moody’s Investors Service, a OAS tinha uma dívida líquida de R$ 7,3 bilhões sobre uma receita de R$ 8,3 bilhões no ano fiscal terminado no dia 30 de setembro de 2014. No dia 28 de janeiro, a agência de classificação rebaixou a OAS de B2 para C, classe de bonds com rating mais baixo, porque a construtora não realizou um pagamento de US$ 16 milhões relativo aos seus US$ 400 milhões em notas sênior sem garantia com vencimento em 2021.

Cristiane Spercel, analista da Moody’s, disse que estima prejuízos para os credores em uma potencial reestruturação de dívida pelo fato de a empresa endividada enfrentar uma combinação de desaceleração econômica, maior volatilidade cambial e acusações de corrupção. Os credores acionarão a OAS na Justiça. Na semana passada, um juiz do estado de São Paulo julgou procedente a expropriação de um terço da participação de 24 por cento da OAS na Investimentos e Participações em Infraestrutura, a Invepar, um consórcio de infraestrutura.

A expropriação foi pedida por detentores de dívidas da OAS que buscam garantir o pagamento, segundo José Eduardo Tavanti, advogado do grupo de credores.

Gota d'água

A OAS disse que tomará medidas para apelar da decisão. A empresa negou as acusações de que movimentou ativos para reduzir seu patrimônio e está apresentando um plano para reestruturar dívidas, que poderia incluir a venda de ativos, segundo um comunicado enviado por e-mail.

O fantasma de novas ações judiciais poderia complicar o plano. A detentora de bonds Aurelius Investment LLC notificou a OAS e potenciais compradores de seus ativos de que o fundo está buscando pagamentos de dívidas, segundo uma queixa apresentada no dia 11 de fevereiro em um tribunal civil. O banco português Caixa Geral também está tentando recuperar dívidas da empresa pela via judiciária.

“É natural que os credores negociem a esta altura para executar garantias e tentar recuperar valor, mas essas ações judiciais tornam mais difícil a liquidação de ativos”, disse Cristiane Spercel, da Moody’s. “A investigação foi a gota que transbordou o copo”.